Lesões Ligamentares do Tornozelo no Esporte.

9 de julho de 2017 | Por

As lesões do tornozelo são frequentes durante as atividades esportivas. Cerca de 40% de todas as lesões esportivas são lesões ligamentares do tornozelo.

 O tornozelo é uma articulação complexa e a estabilidade depende de sua estrutura óssea e ligamentar. A estabilidade óssea é máxima com o tornozelo posicionado em dorsiflexão, enquanto que os ligamentos exercem sua função máxima durante a posição de flexão plantar.

A estrutura ligamentar compreende os complexos ligamentares lateral e medial. A grande maioria das lesões ligamentares abrangem o complexo ligamentar lateral, formado pelos ligamentos talo-fibular anterior, calcâneo-fibular e talo-fibular posterior.

O ligamento talo-fibular anterior é um ligamento importante na estabilização ântero-posterior, prevenindo a subluxação anterior do tálus. O ligamento calcâneo-fibular é um ligamento extra-capsular, apresenta uma inserção oblíqua à margem póstero-lateral do calcâneo e apresenta fibras dispostas perpendicularmente ao eixo horizontal da articulação subtalar. Funciona como um estabilizador primário das articulações tíbio-talar e sub-talar, sobretudo na posição de dorsiflexão e apresenta uma força quatro vezes superior ao ligamento talo-fibular anterior. O ângulo formado entre os ligamentos talo-fibular e calcâneo-fibular favorece o risco de lesões com o tornozelo posicionado em inversão.

O mecanismo de lesão mais freqüente no esporte é a flexão plantar e inversão forçadas do tornozelo e o ligamento talo-fibular anterior é o mais frequentemente lesado.

Durante a torção, pode-se ouvir um estalido ou apenas sentir dor intensa, geralmente localizada na região lateral do tornozelo. Após alguns minutos observa-se inchaço localizado (edema), formação de hematoma, limitação de movimentos e dificuldades em apoiar o pé no chão.

A história clínica é de extrema importância na elaboração do diagnóstico clínico. O exame físico revela pontos de dor, edema, equimose, hematoma e testes especiais permitem avaliar a estabilidade do tornozelo, como os testes da gaveta anterior e o tilt talar.

O teste da gaveta anterior é realizado com o joelho flexionado para relaxar os músculos gastrocnêmios. A tíbia distal é estabilizada com uma das mãos e o calcanhar é tracionado anteriormente com a outra mão do examinador. Uma translação igual ou maior do que 5mm indica lesão do ligamento talo-fibular anterior. A ausência de um ponto final firme durante o movimento indica a rotura completa do ligamento.

O teste do tilt talar (inclinação talar) avalia a integridade do ligamento calcaneofibular. A tíbia distal é estabilizada com uma das mãos e com a outra mão do examinador o tálus é rodado em inversão. O grau de inclinação do tilt talar são comparados ao outro lado.

Classificação

Clanton e McBryde classificaram as lesões ligamentares do tornozelo em quatro graus baseando-se no tipo e número de ligamentos lesados. As lesões grau 4 representam maior instabilidade ligamentar.

  • Grau 1 – Ligamento talo-fibular anterior
  • Grau 2 – Ligamentos talo-fibular anterior e calcâneo-fibular
  • Grau 3 – Ligamentos talo-fibular anterior, calcâneo-fibular e talo-fibular posterior.
  • Grau 4 – Ligamentos deltóide e tíbio-fibular.

As lesões grau 1 representam 30% dos casos e são geralmente benignas, sem promover instabilidade residual. As lesões grau 2 podem ser identificadas através dos testes positivos de Gaveta Anterior e Tilt talar (inclinação talar). As lesões grau 3 desencadeiam instabilidade em varo e representam 40% dos casos encontrados no esporte.

As lesões grau 4 ocorrem durante movimentos de eversão, rotação externa e dorsiflexão do tornozelo e representam 15% dos casos. Alguns casos apresentam lesão da sindesmose tíbio-fibular, que pode necessitar de reparação cirúrgica.

A preocupação do tratamento adequado das lesões ligamentares do tornozelo deve-se em parte à incidência de instabilidade residual, que pode comprometer a prática esportiva. A literatura registra cerca de 20% de incidência de instabilidade funcional nos tornozelos que sofreram lesões ligamentares.

As radiografias sob estresse não são utilizadas com freqüência nos casos agudos, mas são geralmente utilizadas nas lesões crônicas para registrar a positividades dos testes da gaveta anterior e do tilt talar.

Os exames diagnósticos de ressonância magnética e de tomografia computadorizada são úteis no diagnóstico de patologias associadas nas torções agudas do tornozelo agudas e nas instabilidades crônicas.

Tratamento das lesões agudas

O tratamento inicial se faz através do programa PRICE, que são inicias em língua inglesa (Protection, rest, ice, compression, elevation), que significam proteção (órteses e muletas), repouso relativo da articulação, gelo, compressão e elevação.

Imediatamente após a torção do tornozelo, uma rápida compressão elástica e a utilização de compressas de gelo (crioterapia) de forma intermitente pode auxiliar no controle da dor e do edema.

As órteses semirígidas são indicadas no tratamento das lesões ligamentares do tornozelo e devem ser combinadas com os métodos de controle do edema (bandagens elásticas, crioterapia) para melhor evolução da lesão.

Medicamentos antinflamatórios e analgésicos estão indicados na fase aguda, a fim de conter a inflamação e o controle da dor. O reparo cirúrgico de lesões agudas é raramente indicado. O tempo de tratamento das lesões deve seguir a biologia do reparo ligamentar, o que significa um tempo de proteção ligamentar de no mínimo quatro semanas, o que corresponde às fase de proliferação e maturação do colágeno.

Na fase de maturação do colágeno, a mobilização passiva da articulação favorece a orientação das fibras de acordo com a direção do estresse e reduzem os efeitos colaterais da imobilização prolongada.

A reabilitação funcional após a imobilização é preferivel ao reparo cirúrgico no manejo das lesões agudas. A reabilitação após o período de imobilização compreende técnicas de cinesioterapia, propriocepção e ganho de força. A utilização de tornozeleiras elásticas ou órteses funcionais para a prática de esportes está indicada por semanas a alguns meses.

O treinamento neuromuscular pode contribuir na prevenção da recidiva das lesões ligamentares do tornozelo, embora haja controvérsias na literatura quanto às diferenças de evolução entre os casos tratados com exercícios orientados em clínicas especializadas ou quando realizado pelo próprio paciente em seu domicílio.

A recuperação completa das lesões ligamentares do tornozelo pode levar tempo e a grande maioria dos casos são benignos, embora 10 a 15% dos casos evoluam para instabilidade.

As falhas do tratamento conservador podem requerer tratamento cirúrgico, sendo a instabilidade e a dor, os principais fatores que levam ao tratamento cirúrgico.

Muitas técnicas cirúrgicas são descritas na literatura abrangendo reparos anatômicos, reforços ligamentares e reconstruções não anatômicas.

Referências Bibliográficas

  1. Brodsky AR, O’Malley MJ, Bohne WH, et al. An analysis of outcome measures following the Brostrom-Gould procedure for chronic lateral ankle instability. Foot Ankle Int 2005; 26:816–819.386.
  2. DiGiovanni BF, Partal G, Baumhauer JF. Acute ankle injury and chronic lateral instability in the athlete. Clin Sports Med 2004; 23:119.
  3. Dijk van CN. Managementofthesprainedankle.BrJSportsMed2002;36:83–4.
  4. Hinterman B, Valderrabano V, Boss A, et al. Medial ankle instability. An exploratory, prospective study of fifty-two cases. Am J Sports Med 2004; 32:183–190.24
  5. Kanbe K, Hasegawa A, Nakajima Y, et al. The relationship of the anterior drawer sign to shape of the tibial platfond in chronic lateral instability of the ankle. Foot Ankle Int 2002;23:118–22.
  6. Lynch SA, Renström PAFH. Treatment of acute lateral ankle ligament rupture in the athlete: conservative versus surgical treatment. SportsMed1999;27:61–71.
  7. Miller RA, DeCoster TA, Mizel MS. What’s new in foot and ankle surgery. J Bone Joint Surg Am 2005; 87:909–917.
  8. Mizel MS, Hecht PS, Marymont JV, Temple HT. Evaluation and treatment of chronic ankle pain. J Bone Joint Surg Am 2004; 86:622 632.
  9. Mosier-LaClair S, Pike H, Pomeroy G. Syndesmosis injuries: acute, chronic, new techniques for failed management. Foot Ankle Clin North Am 2002; 7: 551–556.
  10. Noronha M, Refshauge K M, Herbert R D, Kilbreath S L. Do voluntary strength, proprioception, range of motion, or postural sway predict occurrence of lateral ankle sprain? Br J Sports Med 2006;40:824–828.
  11. Okuda R, Kinoshita M, Morikawa J, et al. Arthroscopic findings in chronic lateral ankle instability. Do focal chondral lesions influence the results of liga- ment reconstruction? Am J Sports Med 2005; 33:35–42.
  12. Pijnenburg ACM, Bogaard K, Krips R, et al. Operative and functional treatment of rupture of the lateral ligament of the ankle. J Bone Joint Surg Br 2002; 85:525–530.
  13. Safran MR, Zachazewski JF, Benedetti RS, et al. Lateral ankle sprains: a comprehensive review. Med Sci Sports Exerc 1999;438–47.
  14. Pijnenburg A.C.M, Van DijkC.N., C.N., Bossuyt P.M.M., and P.M.M., and Marti R.K. Treatment of ruptures of the Lateral Ankle Ligaments: A Meta -Analysis. J Bone Joint Surg 2000, 82-A, (6), 761-773.