É possível triar os atletas que podem sofrer lesões músculo-esqueléticas?

18 de junho de 2018 | Por

Organizações como o Comitê Olímpico Internacional (COI) e a Federação Internacional de Futebol (FIFA) divulgaram diretrizes sobre a triagem de atletas e jogadores, tentando estabelecer um padrão de cuidado que auxilie na detecção precoce de problemas cardiovasculares e outros problemas de saúde.

Normalmente, isso consiste em um exame cardiovascular abrangente, uma avaliação médica geral (incluindo exames de sangue) e uma avaliação musculoesquelética a ser realizada em todos os atletas. Aqui, nos concentraremos no componente musculoesquelético da triagem.

Evidências científicas que demonstram quão valiosos são os testes musculoesqueléticos, quais são os melhores testes a serem usados, e se esses resultados estão realmente associados com a lesão musculoesquelética, infelizmente, são escassas. 

Atualmente existem fatores importantes a serem considerados ao se criar uma bateria de testes, nos quais o objetivo é rastrear alguns dos fatores de risco em potencial. É importante ressaltar que esses resultados de testes devem ser interpretados para o atleta individualmente, o que permite a intervenção adequada e a tomada de decisões pela equipe médica, com base em uma combinação de evidências de pesquisa e as melhores práticas atuais. Embora não exista evidência empírica, há um consenso crescente entre os profissionais de que o monitoramento regular dos fatores de risco permitirá intervenções mais apropriadas e oportunas.

Nenhum dos testes utilizados atualmente são eficazes para realizar a triagem musculoesquelética ou realizar o monitoramento de atletas individualmente. Esses testes simplesmente não possuem todas as propriedades adequadas para executar essa função, e portanto continuamos a ver lesões em atletas monitorados em todos os esportes, independentemente de seus resultados de triagem. 

No entanto, as intervenções aplicadas devem idealmente ser monitoradas para cada atleta individualmente, já que a adaptação e a reação a essas intervenções podem diferir entre os atletas, e a individualização desses exercícios pode ser necessária para garantir que a eficácia seja maximizada.

Outro motivo para conduzir uma triagem é estabelecer uma linha de base de desempenho para o atleta na ausência de lesão ou doença. Por exemplo, se um atleta sofrer uma lesão no tendão durante a temporada, a força ou os testes funcionais realizados durante a triagem podem representar um ponto de referência útil para o praticante determinar respostas durante todo o processo de retorno ao esporte, e pode auxiliar na tomada de decisões durante este período. Alternativamente, se o clube decidir adicionar um programa específico de treinamento ou fortalecimento durante a temporada, um teste de linha de base pode ajudar a equipe a estabelecer se o programa foi bem-sucedido e onde direcionar futuros programas de prevenção de lesões.

A relação entre o atleta e a equipe médica é essencial para criar confiança e um ambiente seguro em que o participante compartilhe abertamente e honestamente suas preocupações e informações físicas. Isso permite um processo de tomada de decisão compartilhado ideal. É também uma oportunidade de fornecer educação em relação a certas políticas de saúde ou estratégias de prevenção de lesões e para receber feedback subjetivo e objetivo dos atletas sobre seu estado atual de saúde.

A triagem geralmente é realizada no início de uma temporada, embora seja necessário buscar outras oportunidades de triagem, como uma revisão no meio do ano, ou no final da temporada para estabelecer programas fora de temporada. Recomenda-se a triagem de final de temporada, que permite a identificação de problemas musculoesqueléticos em andamento para receber atenção antes que os atletas voltem a treinar no início da próxima temporada.

Embora a triagem mais abrangente provavelmente ainda aconteça durante a pré-temporada, a triagem musculoesquelética deve ser sensivelmente repetida durante toda a temporada para determinar como as variáveis respondem ao treinamento e à competição para cada atleta, bem como ao nível da equipe. Isso pode ajudar a equipe médica e de desempenho a tomar decisões mais bem informadas sobre a saúde dos jogadores, além de reduzir o risco de lesões.

Uma vez que uma bateria de testes tenha sido selecionada, é importante que os testes sejam padronizados e, se repetidos, sejam feitos da mesma maneira. A hora do dia, a influência das sessões de treinamento e outros fatores externos devem ser considerados sempre que possível para garantir que as medidas de rastreamento usadas sejam consistentes, e a comparação com os resultados anteriores seja significativa.

Idealmente, toda a equipe médica deve estar envolvida na triagem. Embora os testes possam ser realizado por membros específicos, é importante que o médico da equipe, o fisioterapeuta e até mesmo o gerente estejam presentes para enfatizar o valor e a importância dos testes. Além disso, possibilita a comunicação direta e imediata e a interpretação dos resultados, permitindo maior transferência dos resultados de forma praticamente significativa.

A triagem inclui uma revisão e consideração de informações não modificáveis, tais como (idade, lesão anterior, etc), bem como risco potencial modificável (por exemplo, força, flexibilidade, aptidão, estado psicológico, carga de trabalho, qualidade de movimento e testes de desempenho). Embora muitas opções estejam disponíveis seguem algumas destas opções:

Testes de força

Vantagens: os testes de força tem acurácia e validade moderadas e podem ser realizados como parte do treinamento. 

Desvantagens: difícil de ser realizado para atletas que competem em 2 jogos/competições por semana, tem custo elevado e requer perícia para interpretar os dados, por ex. gráficos

  • Dinamômetro isocinético (força excêntrica, desequilíbrios lado-a-lado, relações funcionais, por exemplo: isquiotibiais e quadríceps). 
  • Dispositivos de campo (Nordbord®) – (resistência excêntrica, desequilíbrios lado-a-lado).Ao interpretar os resultados de força do Nordbord, pode ser importante normalizá-lo para a massa corporal
  • Dinamômetro portátil (HHD) (força isométrica). O teste isométrico pode ser uma alternativa segura durante períodos de muitas competições na temporada e faz parte do monitoramento de recuperação
  • Plataforma de força (força isométrica, potência concêntrica e duração excêntrica) 

Arco de movimento ativo e passivo

Vantagens: acurácia e validade moderadas para todos esses testes, baixo custo, fácil de executar, testes simples para informar as intervenções de fisioterapia diárias, pode ser útil na tomada de decisões de retorno ao esporte, poderia fazer parte da bateria de monitoramento de recuperação, pode fazer parte de uma simples avaliação médica geral e diária, não há a necessidade de se usar todos os testes

Desvantagens: difícil de ser realizado para atletas que competem em 2 jogos/competições por semana

  • Teste de elevação de perna reta (Straight leg raise test)
  • Sit and reach test
  • Teste de extensão do joelho passiva e ativa (Bent knee fall out (BKFO))
  • Amplitude de movimento de rotação interna / externa do quadril. Dorsiflexion lunge test 
  • Teste de Thomas
  • Teste de flexão para frente (Standing forward flexion test)
  • Joelho à parede (Knee-to-wall)

Qualidade de movimento

O objetivo é determinar a qualidade dos movimentos controlados realizados.

Considere uma rotina com os mesmos avaliadores, com interpretação cuidadosa dos resultados

Vantagens: baixa a moderada precisão, visão holística dos padrões de movimento, fácil de administrar (uma vez treinado e atletas familiarizados)

Desvantagens: grande variabilidade sazonal em pontuação, subjetivo (excluindo exames laboratoriais), relação questionável ao risco de lesões

  • Avaliação de movimento funcional (Functional Movement Screen (FMS)) 
  • Teste de movimento funcional 9+
  • Sistema de avaliação dos erros de aterrissagem (Landing Error Scoring System (LESS))
  • Avaliação de movimento de lesão de futebol (Soccer Injury Movement Screen (SIMS) )
  • Avaliações de aterrissagem em laboratório

Referências bibliográficas

1. McCall A, Carling C, Davison M, et al. Injury risk factors, screening tests and preventative strategies: a systematic review of the evidence that underpins the perceptions and practices of 44 football (soccer) teams from various premier leagues. Br J Sports Med. 2015;49(9):583-589.

2. Ekstrand J. Keeping Your Top Players on the Pitch: The Key to Football Medicine at a Professional Level. BMJ Publishing Group Ltd and British Association of Sport and Exercise Medicine; 2013.

3. McCall A, Dupont G, Ekstrand J. Injury prevention strategies, coach compliance and player adherence of 33 of the UEFA Elite Club Injury Study teams: a survey of teams’ head medical officers. Br J Sports Med. 2016;50(12):725-730.

4. Arne L, Manuel AJ, Roald B, et al. The Inter- national Olympic Committee (IOC) Consensus Statement on Periodic Health Evaluation of Elite Athletes. 2009.

5. Mendiguchia J, Alentorn-Geli E, Brughelli M. Hamstring strain injuries: are we heading in the right direction?

Br J Sports Med. 2012;46(2):81–85.

6. Bahr R. Why screening tests to predict injury do not work—and probably never will…: a critical review. Br J Sports Med. 2016;50(13):776-780.

7. Van Dyk N, Clarsen B. Prevention forecast: cloudy with a chance of injury. Br J Sports Med. 2017;51(23):1646-1647.

8. Bakken A, Targett S, Bere T, et al. Health conditions detected in a comprehensive periodic health evaluation of 558 professional football players. Br J Sports Med. 2016:bjsports–2015.

9. Dijkstra HP, Pollock N, Chakraverty R, Alonso JM. Managing the health of the elite athlete: a new integrated performance health management and coaching model. Br J Sports Med. 2014;48(7):523-531.

10. Van Dyk N, Bahr R, Burnett AF, et al. A comprehensive strength testing protocol offers no clinical value in predicting risk of hamstring injury: a prospective cohort study of 413 professional football players. Br J Sports Med. July 2017:bjsports-2017-097754.

11. Croisier J-L, Ganteaume S, Binet J, Genty M, Ferret J-M. Strength Imbalances and Prevention of Hamstring Injury in Professional Soccer Players: A Prospective Study. Am J Sports Med. 2008;36(8):1469-1475.

12. Van Dyk, N N, Bahr R, Whiteley R, et al. Hamstring and Quadriceps Isokinetic Strength Deficits Are Weak Risk Factors for Hamstring Strain Injuries: A 4-Year Cohort Study. Am J Sports Med. 2016;44(7):1789-1795.

13. Petersen J, Thorborg K, Nielsen MB, Budtz-Jorgensen E, Holmich P. Preventive Effect of Eccentric Training on Acute Hamstring Injuries in Men’s Soccer: A Cluster-Randomized Controlled Trial. Am J Sports Med. 2011;39(11):2296-2303.

14. Opar DA, Williams MD, Timmins RG, Hickey J, Duhig SJ, Shield AJ. Eccentric Hamstring Strength and Hamstring Injury Risk in Australian Footballers: Med Sci Sports Exerc. 2015;47(4):857-865.

15. Whiteley R, Jacob- sen P, Prior S, Skazalski C, Otten R, Johnson A. Correlation of isokinetic and novel hand-held dynamometry measures of knee flexion and extension strength testing. J Sci Med Sport. 2012;15(5):444-450.

16. Van Doormaal MCM, van der Horst N, Backx FJG, Smits D-W, Huisstede BMA. No Relationship Between Hamstring Flexibility and Hamstring Injuries in Male Amateur Soccer Players: A Prospective Study. Am J Sports Med. 2017;45(1):121-126.

17. Witvrouw E, Dannee- ls L, Asselman P, D’Have T, Cambier D. Muscle flexibility as a risk factor for developing muscle injuries in male professional soccer players a prospective study. Am J Sports Med. 2003;31(1):41–46.

18. Moran RW, Schneiders AG, Mason J, Sullivan SJ. Do Functional Movement Screen (FMS) composite scores predict subsequent injury? A systematic review with meta-analysis.. Br J Sports Med.

2017;51(23):1661-1669.

19. Bakken A, Targett S, Bere T, et al. The functional movement test 9+ is a poor screening test for lower extremity injuries in professional male football players: a 2-year prospective cohort study. Br J Sports Med. May 2017: 10.1136/ bjsports-2016-097307.

20 Padua DA, Marshall SW, Boling MC, et al. The Landing Error Scoring System (LESS) is a valid andreliable clinical assessment tool of jump-landing biomechanics: the JUMP-ACL study. Am J Sports Med. 2009;37(10):1996-2002.

21. McCunn R, aus der Fünten K, Govus A, et al. The intra and inter-rater reliability of the soccer injury movement screen (SIMS). Int J Sports Phys Ther. 2017;12(1):53-66.

22. Krosshaug T, Steffen K, Kristianslund E, et al. The vertical drop jump is a poor screening test for ACL injuries in female elite soccer and handball players: a prospective cohort study of 710 athletes. Am J Sports Med. 2016;44(4):874-883.

23. Whittaker JL, Booysen N, de la Motte S, et al. Predicting sport and occupational lower extremity

injury risk through movement quality screening: a systematic review. Br J Sports Med. 2017;51(7):580-585.

24. McCunn R, aus der Fünten K, Fullagar HHK, McKeown I, Meyer T. Reliability and association with injury of movement screens: a critical review. Sports Med. 2016;46(6):763- 781.

25. Buchheit M. Want to see my report, coach. Aspetar Sports Medicine Journal. 2017 Targeted topic Volume 6 Straight science

  1. Ricard Pruna, Thor Einar Andersen Ben Clarsen, Alan McCall in Muscle Injury Guide: Prevention and Treatment of Muscle Injuries